Veículos mais velozes e capazes de levar pessoas a lugares inalcançáveis precisam, antes de tudo, manter a integridade das vidas que transportam.
Viajar mais rapidamente, descer às profundezas ainda inexploradas do oceano e sobreviver em órbita por tempo indeterminado são apenas algumas das metas que gostaríamos de alcançar. Para que possamos continuar nessa busca constante de conhecimento, continuamos a aperfeiçoar automóveis, submarinos e até foguetes capazes de nos levar “aonde nenhum homem jamais esteve”.
Porém, muitas vezes o avanço é bloqueado não pela falta de tecnologia ou de orçamento, mas pelos limites do corpo humano. Um carro capaz de alcançar velocidades assustadoras poderia gerar consequências muito desagradáveis para os seres humanos que estivessem dentro dele. Afinal, romper os recordes de velocidade é importante, mas não tanto quanto entregar o passageiro com vida no destino final.
Portanto, antes de sair por aí querendo conquistar o mundo e entrar para os livros de História, saiba quais condições o corpo humano é capaz de aguentar e como estamos trabalhando para driblar essas limitações.
Aceleração: só jedi aguenta tanta força
Quem anda de montanha-russa também sofre as ações da força G
A grande dificuldade em acelerar demais um veículo é o fato de que o passageiro pode perder a consciência ou sofrer danos permanentes causados pela força G, que é medida com base na constante gravitacional (9,8 m/s²).
Ao fazer uma curva em alta velocidade, por exemplo, o piloto de Fórmula 1 enfrenta uma força de até 5 g. Na prática, isso significa que uma força cinco vezes maior do que o peso do piloto agirá contra ele.
Os efeitos da força G no corpo humano variam de acordo com a grandeza, tempo, direção e local onde essa aceleração está agindo. Além disso, a postura do corpo humano durante a ação da força também é muito importante. Um tapa desferido contra o rosto de alguém pode provocar centenas de g em um determinado ponto, mas não produzirá nenhum dano grave. Entretanto, uma força de 16 g durante um minuto pode ser fatal.
Quando um avião sobe em uma posição totalmente ereta, como em manobras militares, por exemplo, a força G é aplicada no eixo vertical. Nesse caso, o piloto pode sofrer variações na pressão sanguínea, podendo chegar a perder a consciência. Dependendo da intensidade, essa força também faz com que o sangue do corpo desça para as pernas e pés, podendo causar danos aos olhos e cérebro de quem esteja dentro da aeronave.
Pilotos de Fórmula 1 enfrentam força de até 5 g nas curvas
Normalmente, uma pessoa comum pode suportar uma força de até 5 g antes de perder a consciência. Porém, com trajes especiais e o devido treinamento, pilotos militares conseguem aguentar até 9 g.
Quando a força G é aplicada no eixo horizontal, em um veículo terrestre, por exemplo, a resistência humana é muito maior. Uma pessoa normal pode aguentar até 17 g, durante alguns minutos, sem perder a consciência.
O recorde de resistência a essa força é de um americano que, curiosamente, nasceu no Estado brasileiro da Bahia. Durante uma série de testes militares realizados nos anos 40 e 50, o coronel John Stapp chegou a alcançar a velocidade de 1.017 km/h em um trenó movido a foguete, freando totalmente dentro de poucos segundos. Com essas experiências, Stapp demonstrou ser possível para um ser humano suportar pelo menos 45 g, desde que a pessoa esteja bem protegida em seu assento.
Esses testes foram essenciais para a aviação moderna, especialmente a militar. Porém, também trouxeram consequências muito desagradáveis para o coronel John, como diversas concussões, fraturas e, ainda pior, o comprometimento da visão de Stapp até o fim de sua vida.
Pressão: temor para quem sobe e desce
Um avião comercial costuma voar a uma altura que varia entre 9 e 12 mil metros, uma altitude em que a vida humana seria impossível, por causa dos efeitos causados pelo ambiente externo. Portanto, para permitir a sobrevivência de passageiros e tripulação, a aeronave deve ser pressurizada, ou seja, mais ar é injetado em seu interior e, com isso, a pressão interna é aumentada, tornando o ambiente mais compatível com o exigido pelo corpo humano.
A famosa despressurização acontece quando há uma falha no sistema de ventilação do avião ou na vedação da cabine, como um buraco ou uma porta mal fechada. Nesse caso, a tendência é que a pressão interna seja igualada à externa, o que pode causar a morte de seus passageiros devido à escassez de oxigênio e, em casos mais extremos, até mesmo a explosão da aeronave.
A pressão também é um problema para quem pretende viajar em sentido oposto, ou seja, alcançar o fundo dos oceanos. Ao mergulhar, o corpo sofre o efeito de pelo menos duas forças: o peso da água e dos gases na atmosfera acima da superfície.
Isso causa mudanças no organismo que expõem o mergulhador a riscos que podem ser fatais, como a possível explosão dos pulmões durante a subida (embolia traumática) e até mesmo a perda de consciência provocada pelos efeitos do nitrogênio quando respirado sob pressão (narcose).
Recorde de profundidade
Submarinos são capazes de eliminar esses efeitos e criar um ambiente confortável para seus tripulantes. Mesmo assim, limites devem ser respeitados. Para explorações mais profundas, usa-se um aparelho conhecido como batiscafo, inventado pelo suíço Auguste Piccard. E foi a bordo de um desses que a humanidade chegou à profundidade máxima alcançada por humanos até hoje.
Em 1960, o batiscafo Trieste levou duas pessoas ao ponto mais baixo da Terra, conhecido como Challenger Deep, nas Fossas das Marianas. Na ocasião, os tripulantes chegaram ao fundo do oceano, alcançando 10,9 mil metros de profundidade. A descida durou mais de 4 horas e, ao ultrapassar os 9 mil metros, a sonda sofreu algumas rachaduras. Foi nessa ocasião que a humanidade descobriu que outros vertebrados poderiam existir em condições tão extremas.
Desde então, nenhuma outra missão tripulada retornou a esse local. Apenas sondas robóticas, como a Kaiko, em 1995, e a Nereus, em 2009, retornaram à Challenger Deep.
Humanos no espaço
Como sabemos, o ser humano não pode sobreviver, sem as devidas proteções, no espaço. A maior de todas as ameaças é a ausência de pressão, além, é claro, da temperatura e dos efeitos da radiação emitida por astros como o Sol.
A principal reação ao ser exposto ao vácuo, um ambiente de pressão tão baixa, é a perda de gases da corrente sanguínea, incluindo o oxigênio. Após 9 segundos nessas condições, o sangue desoxigenado alcança o cérebro e a pessoa perde a consciência. Se continuar assim por mais dois minutos, o ser humano pode morrer.
Certamente, essa reação não é tão “divertida” quanto às que são normalmente exibidas em filmes. De acordo com a NASA, na vida real a pessoa exposta sem proteção ao vácuo não explode, não congela, o sangue não entra em ebulição e a morte não é instantânea, como Hollywood faz parecer.
Entretanto, em um acidente ocorrido durante a década de 60, um astronauta com um pequeno vazamento no traje espacial ficou exposto a um ambiente muito similar ao do vácuo espacial e declarou que, antes de desmaiar, ele percebeu e chegou a ouvir os gases que saiam do seu corpo. Sua última lembrança foi a de sentir a saliva ferver em sua boca.
Contudo, com a tecnologia desenvolvida por laboratórios de pesquisas espaciais, somos capazes de driblar esses e outros problemas. Atualmente, o fator que mais incomoda o ser humano no espaço é o ambiente de microgravidade, que causa impactos em diversos aspectos do nosso corpo.
Efeitos em astronautas com traje espacial
A microgravidade pode causar atrofiamento dos músuculos e pedras nos rins (Fonte da imagem: NASA)
Sem a força da gravidade, os músculos não precisam mais sustentar o corpo e, com o passar do tempo, podem acabar se atrofiando. Além disso, o ser humano também pode ficar um pouco desorientado pela diminuição da gravidade, podendo sofrer enjoos, que passam depois de alguns dias no espaço.
Outra mudança acontece com os fluídos, que compõem 60% do nosso corpo. No ambiente de microgravidade, esses fluídos “sobem”, sendo redistribuídos na parte superior do corpo, causando um inchaço no rosto e congestão nasal. Também há uma diminuição de 20% do plasma sanguíneo.
Assim como os músculos, nosso esqueleto também não é mais necessário para manter a postura do corpo no espaço. Assim, o metabolismo muda e o astronauta chega a perder 1,5% de tecido ósseo por mês. O nível de cálcio no sangue aumenta e, com o passar do tempo, resulta em pedras no rim e calcificação de tecidos. Ainda não se sabe se a recuperação dos ossos e músculos é completa após o retorno para a Terra.
Ainda há muitos avanços a serem conquistados antes que seres humanos possam viajar durante meses ou anos pelo espaço sideral. Só nos resta esperar para ver o que futuro nos reserva.
Fonte: Felipe Arruda (TecMundo)
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